quinta-feira, 25 de fevereiro de 2010

Foto

Hoje vi uma foto.
A princípio, me pareceu um tanto desfocada, as cores desmaiadas, com a tinta de muito tempo.
Foi, no entanto, ficando mais nítida.
Havia nela um parque, ou algum lugar arborizado com cara de infância, paz ou velhice.
Havia um banco, desses de praça. Nele, dois sujeitos. Curvados, gastos.
Um alimentava pombos, tentava falar com eles, fazia sons que os imitavam.
O outro sorria, ria, gargalhava. Tentava imitar os pombos. Não conseguia. Gargalhada do outro.
Vestiam roupas sóbrias, quase escuras, em um fim de tarde ameno, perto do inverno.
Curvos e gastos que eram, pareciam, no entanto, fortes, felizes.
O inverno era iminente, eles sabiam. Mas não temiam. Estavam agasalhados, protegidos, seguros.
Tinham uma taça de vinho na mão. Pareciam prestes a brindar algo importante.
A foto se mexe. Foto estranha. Foto cinética.
E eles brindam. E se olham. E tudo estava dito.

Na verdade, nunca vi essa foto.
Mas tenho certeza de que serei parte dela um dia...

quinta-feira, 11 de fevereiro de 2010

Sumiço

Sim, eu sumi. Sumi porque depois das últimas postagens, muita coisa mudou.
Sumi porque o estado de espírito que me levou a criar o "pato" modificou-se.
Não está mais aqui presente o romântico cético, o solteiro feliz-solitário, o observador pretensamente arguto das mazelas labirínticas do interior humano.
O Pato ressurge sob outro espectro: o espectro do amor suave e intenso, ao mesmo tempo de sonho e real.
É um novo Pato; é um novo Raul.

segunda-feira, 3 de agosto de 2009

Chasing Cars

"Let's waste time/Chasing cars/around our heads". O título dessa canção do Snow Patrol sempre me soou meio que como uma incógnita: como assim, "perseguindo carros"? O que me movia para escutá-la, como fiz tantas vezes, era o tom melancólico da interpretação, a melodia sensível e quase triste, alguns versos que eram mais fáceis de entender sem ter que prestar muita atenção ou correr pro metrolyrics.com.
Em um dia qualquer, como cabe às boas epifanias, subitamente o título (e a letra como um todo) fez sentido.
"Vamos gastar o tempo/Perseguindo carros/Em nossas cabeças". A tradução não-linguística pareceu me dizer: Vamos ficar aqui, sem nos preocupar com tempo-hora-lógica, criando nossa própria cronologia sentimental, nosso próprio tempo-emoção. Vamos apenas "lay here/and just forget the world".
Senti, na falta de uma palavra melhor que defina um sentimento próximo a este, inveja daquele contexto, do deixar-se largar em um corpo alheio, cheio de cumplicidade, silêncio e intensidade descrito pela letra. Percebi que a canção falava da criação de um mundo, em que o eu-lírico e a pessoa amada inventavam um novo compasso para as medidas e comprimentos que limitam e definem nossas existências.
Como tudo que é subjetivo, no entanto, há uma leitura distinta, um contraponto quase paradoxal...
Perseguir carros pode, também, significar uma procura contínua e infrutífera.
Pode significar uma inquietude consciente, que tem nessas perseguições aparentemente sem sentido uma desculpa pra se manter buscando o inatingível, o que é apenas sonho, ilusão. Olhando dessa forma, o "chaser" sabe, e até anseia por isso, que se colocará diante de desafios cujo sucesso é improvável, seja pela velocidade dos carros, seja pela distância em que eles já se encontram. Como o fazem os cães...
E, diante dessa constatação, surge um novo paradoxo: não é visível o prazer, a excitação dos cães, quando os observamos perseguindo carros?

sábado, 25 de julho de 2009

As noites de sábado

Existe coisa mais solitária que noite de sábado? Explico-me.
Mais do que em qualquer outro dia da semana, o sábado é o dia em que você socializa, namora, paquera, e isso traz uma certa angústia, que denuncia uma carência muito próxima da solidão. É como se fosse uma quase-obrigação: você mostra quão querido/sedutor/sociável você é pela agitação de sua vida social nesse dia.
Toda vez que optei por ficar em casa no sábado (o que é raro, é verdade), parecia que eu estava fazendo algo ilícito, que escondia um segredo. O que não deixava de me dar uma sensação de independência e liberdade: é como se eu estivesse mostrando pra mim mesmo que estar só comigo mesmo numa noite de sábado não me incomoda, o que supostamente diz muito sobre minha excelente auto-estima. Que não sou só como os desesperados das madrugadas, nas boates, butecos e undergrounds, que se embebedam, criam coragem para tudo e geralmente fazem alguma merda. E ainda voltam sozinhos pra casa (essa imagem, maravilhosamente descrita em uma música dos She wants Revenge chamada "It's just begun", muito me incomoda).
Creio que é preciso haver uma imunidade contra a ansiedade/solidão das noites de sábado. Creio que ficar em casa no fim de semana não aguça a carência de ninguém. Isso! Creio nisso!

Agora vou tomar banho, porque preciso sair pra dançar.

Bem-vindo

Este é apenas mais um lugar. Um lugar como outro qualquer. Se há algo especial nele, é apenas o fato de que, quando estou aqui, as dinâmicas sociais se resumem ao que penso, sinto, quero. Não dependo do limite ou do direito alheio, só do meu. Portanto, dentre outros, como minha casa e minha cosciência, este é meu lugar.

Seja bem-vindo!